Nascida no Canadá, criada no Ribatejo, actualmente a viver em Coimbra, com fugas em datas certas ao Alentejo já me sinto também um pouco alentejana.
O Alentejo, pensava eu no Sábado, é outro país. Soubesse eu descrever por palavras o motivo de tal conclusão, fá-lo-ia, mas é preciso sentir um certo sentir que a minha escrita não vos sabe levar.
Tem de se entrar devagarinho e ir ficando (no gerúndio, claro, ir ficando... apreciando...). As estrelas são mais brilhantes. A luz tem véu próprio. As praias são céus. Até as azedas sabem diferente, são doce-azedo.
E as gentes? Não me vou arrogar falar das gentes. Sou privilegiada quanto às gentes com quem tenho privado, não generalizarei.
No entanto, penso que quando falamos das gentes do Alentejo, deve ser feita justiça quanto a uma coisa: as gentes do Alentejo são diferentes das de outras regiões do nosso país, são gentes habituadas a ter de se distanciar para o cumprimento das necessidades básicas. Existem situações pontuais de aldeias no Norte e Interior de isolamento, quando falamos de Alentejo, falamos de isolamento sem excepções.
Existem dois hospitais distritais entre o Algarve e Setúbal – o Hospital do Litoral Alentejano e o Hospital José Joaquim Fernandes, do Centro Hospitalar do Baixo Alentejo.
As maleitas parecem ignorar que Domingo é o 7º dia do Senhor, dia de descanso. Ontem, Domingo, não havia no Hospital de Santiago do Cacém, cuja extensão geográfica de atendimento está representada no mapa, um médico radiologista de serviço, nem disponível ou whatsoever...
Não sei escrever crítica social e económica. Poderia deixar para aqui duas ou três baboseiras sobre o que penso de gente que se queixa de barriga cheia e de governantes que têm a sorte de nunca ter tido um familiar necessitado num hospital tão bem equipado como o de Santiago do Cacém, porém tão carenciado de pessoal. Hoje digo: revolta e desalento.
No entanto, penso que quando falamos das gentes do Alentejo, deve ser feita justiça quanto a uma coisa: as gentes do Alentejo são diferentes das de outras regiões do nosso país, são gentes habituadas a ter de se distanciar para o cumprimento das necessidades básicas. Existem situações pontuais de aldeias no Norte e Interior de isolamento, quando falamos de Alentejo, falamos de isolamento sem excepções.
Existem dois hospitais distritais entre o Algarve e Setúbal – o Hospital do Litoral Alentejano e o Hospital José Joaquim Fernandes, do Centro Hospitalar do Baixo Alentejo.
As maleitas parecem ignorar que Domingo é o 7º dia do Senhor, dia de descanso. Ontem, Domingo, não havia no Hospital de Santiago do Cacém, cuja extensão geográfica de atendimento está representada no mapa, um médico radiologista de serviço, nem disponível ou whatsoever...
Não sei escrever crítica social e económica. Poderia deixar para aqui duas ou três baboseiras sobre o que penso de gente que se queixa de barriga cheia e de governantes que têm a sorte de nunca ter tido um familiar necessitado num hospital tão bem equipado como o de Santiago do Cacém, porém tão carenciado de pessoal. Hoje digo: revolta e desalento.
fotografia das azedas surripiada à menina-alice
10 comentários:
O Alentejo é isso mesmo revolta e desalento, nem procurando encontrarias duas palavras que o definem melhor.
Conheço toda a situação que descreves.
Contudo, temo que se possa criar aqui uma imagem um pouco perniciosa.
É verdade que existe falta de pessoal no Hospital de Santiago, mas também em Lisboa (onde, segundo a ideia corrente, se investe em tudo em detrimento do resto do país), já estive sete horas com problemas de equilíbrio, vómitos e vertigem labiríntica, conjunto de sintomas que para os médicos presentes foi muito difícil controlar, apesar de ser uma situação facilmente controlável por um otorrinologista que, sorte a minha (!), também estava indisponível numa terça-feira de manhã.
Só queria deixar presente a ideia que dizer do Alentejo que este é definível pelas palavras: revolta e desalento, parece-me em todo o caso, um pouco abusivo.
[eu nasci no hospital velhinho ;) ]
Um beijo.
Scar, Alice, eu não disse que o Alentejo é revolta e desalento, essas foram palavras para descrever um estado de espírito.
Alice, não percebi muito bem o contexto da situação que tu descreves (… 1 otorrino apenas num hospital de Lisboa?).
Compreendo o teu comentário e sei que conheces a situação, mas permito-me uma defesa… a responsabilidade da interpretação perniciosa será em grande parte de quem lê, não criei uma imagem, descrevi factos de uma situação real. Não tenho qualquer intenção de denegrir seja o que for mas também me parece injusto para a população em causa comparar a falta de pessoal em Lisboa com a falta de pessoal no Alentejo. Mesmo tendo em conta as diferenças na densidade populacional e imaginando uma estatística que demonstrasse existir a mesma quantidade de profissionais por habitante em ambas zonas, teríamos sempre o factor distância geográfica, basta olhar o mapa, quem vive em Santiago do Cacém seria, nesse caso, privilegiado, já os do interior....
Qualquer falta ou injustiça na saúde e na educação é suficiente por si só, seja onde for e com quem for, jamais quereria fazer divisões.
O que me trouxe a revolta e o desalento foi o sentir a existência das fronteiras. Elas existem e as suas consequências também. Não veio do nada o comentário desse inominável que dizia ser o Alentejo um deserto, imagino que ele não seja o único a pensar assim. O Alentejo, para uma grande parte das pessoas, é essa chatice de troço a caminho do Algarve...
Disse para aqui muita coisa, voltando ao que estava em causa... são as limitações a que eu e os que amo nos vimos sujeitos: revolta e desalento. Detesto… odeio esta sensação de que só quando acontecer ago similar ao familiar de algum VIP é que se faz algo…
Não, margarete, nenhum otorrino durante uma manhã inteira! Detesto os comentários nestas caixas por causa disto... eu entendi o que partilhaste, e sei que descreveste factos e manifestaste um estado de espírito em relação a esses acontecimentos. Eu apenas quis deixar presente que as faltas e insuficiências são transversais a todo o lado, até mesmo em Lisboa – este é um problema de fundo do nosso sistema de saúde! Do nosso e talvez de outros ( pois temos sempre esta mania muito “portuguesinha” de olhar para nós como os últimos dos desgraçados). Voltando ao meu comentário, reagi, talvez influenciada pelo comentário anterior. Assustou-me a ideia de se pensar o Alentejo como revolta e desalento, só.
Quanto ao entendimento do Alentejo como um deserto, para uma grande parte das pessoas (como tu afirmas), é sintomático da nossa limitação. Aqui sim nos distanciamos e muito de outros. Não viajamos (ou melhor, não viajamos para lá do Algarve) e isso, como tu sabes, limita-nos muito na concepção do que nos rodeia. Beijo.
mas a tua prosa sabe muito bem levar-nos ao Alentejo, sim senhora...
Beijo
Como disse ao C., tenho tido o melhor a dizer deste hospital, mas acredito piamente que aconteçam tristezas como a que descreves e lamento-o. Mais logo dizemos coisas para saber desenvolvimentos.
Com beijos.
Ah! O mimo da minha foto foi a surpresa saborosa do dia. :)
Un estado de espirito que descreve muito bem o alentejo, é a minha opiniao claro.
Até a senhora alice que se indignou tanto veio reforçar omeu pensamento.
P.S. mania portuguesinha é melindrar-se muito porque lhe tocam a "aldeia"
as manifestações são sempre reflexo de uma opinião. por isso é que se podem discutir. eu não me indignei, apenas manifestei outra perspectiva. ao que parece não ofendi ninguém... ah e argumentos ad hominem são erros de raciocínio.
a referência à nossa limitação, é a constatação de um facto, apenas isso.
margarete, espero sinceramente que o problema de saúde tenha melhorado.
As caixas de comentários são limitadas, mas é possível "conversar" e sem ter de estar de acordo, claro ;)
Estou convicta do isolamento do Alentejo, não por um caso único e pessoal que tive a infelicidade de viver, mas porque me convenceram factos reais relatados por pessoas que vivem e trabalham na saúde e na educação no Alentejo - no público e no privado.
O que pretendi descrever ao falar de fronteiras foi precisamente isso. Sei que há episódios infelizes e até fatais em qualquer lugar, seria pateta se não o quisesse admitir. Reli o que escrevi e não me parece que tenha deixado transparecer a ideia de que no resto do país não haja faltas e insuficiências, porém o que refiro não se encaixa na transversalidade "normal"/"habitual" que serve sempre como um distractivo do género "ah e tal, isso acontece em todo o lado, até nos países mais desenvolvidos" - detesto rotular, mas este tipo de comentário encaixo-os nos sentimentos de fuga e não são muito diferentes de sentimentos de inferioridade, não me impressionam. (assim como não impressionam argumentos ad hominem... concordando contigo, Alice) (a transversalidade é real mas não pode servir como ocultador de outro problema - o do isolamento/negligência de zonas específicas).
Enfim, infelizmente, estou agora ainda mais convencida de que as fronteiras são reais, com consequências reais nas vidas das pessoas. Não estou aqui para persuadir ninguém e até penso que vive mais feliz e despreocupado quem tem uma ideia melhor (menos má) da situação.
Adenda: não só o hospital tem falta de profissionais, como acabei por constatar que os profissionais (os que "nos calharam", pelos menos...) são muito simpáticos mas não empáticos (entenda-se por empatia um processo profissional necessário e indispensável a quem trabalha em saúde e educação – vou dando conta de que há preconceito em relação à empatia, por isso esta ressalva); a simpatia é algo que se usa nas relações pessoais e ninguém é obrigado a sê-lo, mas é negligência trabalhar sem empatia
Adenda à adenda: (para não gerar confusão :p) não acho que essa falta de empatia seja causa das fronteiras referidas no post, mas ajudou a dificultar a vivência da situação…
Enviar um comentário